da [minha] impotência

Era pra estar em festa. Era pra ser alegria do início ao fim de cada dia de carnaval, aqui nessa cidade que amo e é de fato maravilhosa. Me sinto como um palhaço, que embora tenha um belo sorriso desenhado no rosto, também carrega uma profunda tristeza, bem lá no fundo dos olhos, para quem o observa mais atentamente.
Sei que deveria esquecer essa bobagem de inferno astral. Sei que deveria eliminar os dissabores e cair na folia. Poderia beber e ficar entorpecida, para emendar uma euforia atrás da outra. Mas a bebida trava, a emoção trava, o coração aperta. Nada desce.

Me sinto perdida no meio da multidão. O que penso e o que sinto estão escondidos. Não sei me alegrar quando triste estou. Não sei fingir, não sei me enganar, não sei sublimar. Quero estar ainda mais só e em silêncio.
O carnaval acontece pelas ruas, pelos blocos, nas emissoras da televisão. Há uma [tentativa de] propagação de energia positiva no ar. Mas não chega em mim. É como se eu estivesse blindada. Não consigo me contaminar pelos bons fluidos.
Fico pensando nas coisas a comemorar. Claro que tenho tido bons motivos, mas o primeiro deles, estar saudável, me deixa inquieta e desconfortável; como posso brindar à minha saúde? Não consigo ser tão egoísta assim, quando penso que na minha casa tem gente aflita, com problemas sérios a serem enfrentados daqui pra diante.
A notícia de um câncer desmorona tudo. E eu não sei lidar com a minha nem com a dor do outro.  Por isso o meu silêncio, tão necessário. Por isso o desabafo numa segunda-feira nada gorda, num carnaval lindo, mas vazio de sentidos para mim.
Agora que desabafei vou aqui na orla e inspirar a energia que vem do sol e do mar. Na maresia me reencontro. E o Cristo, lá do alto, redentor de todos nós, há de me inspirar e afastar essa nuvenzinha que teima em ficar suspensa em mim. Quero mais que um desenho de sorriso. Não quero mais lágrimas. Não quero maquiagem. Não quero fantasias. Quero voltar a ter esperança de uma realidade melhor e um futuro melhor para os meus.