12 November 2022

7 anos: reflexões de um ciclo

Hoje não é qualquer dia 12! Não é qualquer mês. Não é qualquer data aleatória. Hoje é o dia em que completo 7 anos da defesa da minha tese de doutorado. Dia da minha negra tese. Escolhi 12 não por acaso. Escolhi novembro não por acaso. 
12 anos de convivência com meu pai, antes de sua partida, me permitiram entender como poderia reverenciá-lo para sempre, por ter sido o pai maravilhoso que foi, o primeiro negro que conheci, que convivi, que admirei e que muito tempo depois, passei a compreender os efeitos do racismo que sofreu sendo homem preto, casado com uma mulher branca. Sou fruto dessa mistura, de uma relação inter-racial e isso diz muito sobre minha história e sobre a história de tantas outras famílias ditas “miscigenadas”. Mistura que provocou e provoca muitas contradições e que legitima ainda muitas desigualdades raciais e, portanto, contribui para fechar muitas portas e janelas para o futuro para muitos brasileiros e muitas brasileiras. 
Para a população negra da qual faço parte o mito da democracia racial, de que não há distinção entre nós, que somos todos seres humanos e que a cor da pele ou os traços fenotípicos não nos limita, que as oportunidades são para todos… bom… na minha trajetória como pesquisadora pude desvelar que as coisas não são assim na realidade. 
Já foram piores, bem da verdade. O conjunto de políticas  públicas afirmativas tem ajudado a modificar a estrutura racista que mesmo inconscientemente até contribuímos para naturalizar afinal desde cedo aprendemos que o sol nasce para todo mundo mas a sombra é naturalmente apenas para alguns afortunados.
Isso não é verdade! Isso é parte de um discurso hegemômico que permite compreender que isso é só um projeto da sociedade brasileira que insiste em não reconhecer o racismo, e essa visão negacionista, em pleno século 21, no ano 2022, depois de tantas mazelas sociais e estragos causados pelo processo de genocídio da população africana escravizada e da população indígena que aqui vivia nesse território colonizado que chamamos de Brasil, tudo isso colabora para tornar esse país preso a este eterno lugar de colônia e de subalternidade. 
Tem preto de jaleco branco? O que eu queria compreender  eu compreendi, em 2015. Temos muito menos do que deveríamos ter. Temos uma política de cotas na universidade pública que ampliou o acesso à medicina, considerada a formação  mais elitista e branca, segundo os dados do IBGE, mas ainda temos muitos desafios para garantirmos uma equidade racial na carreira médica. 
Temos poucos professores médicos negros concursados e atuando nos cursos.
 Temos um currículo que ainda não prioriza a saúde da população negra. 
Temos baixa assistência médica  sobretudo no norte e nordeste, nas populações do campo, ribeirinhas, quilombolas e indígenas. 
Temos a desigualdade regional resultante do sistema de seleção unificada (Sisu) que favorece a entrada de mais estudantes de medicina das regiões Sul, Centro-Oeste e Sudeste em seus estados e também no Norte e Nordeste. 
Temos uma educação básica que ainda não pauta o antirracismo nem no currículo e muito menos ainda no projeto político pedagógico nas escolas públicas e privadas.
 7 anos atrás eu apontei essa série de desafios no meu trabalho, que continuam atuais e que eu compreendo que precisarão ser enfrentados no novo governo Lula, que sem dúvida alguma fez a diferença em seus mandatos anteriores e agora pode avançar com novas políticas para enfrentar esses retrocessos provocados estrategicamente no governo atual. 
Não há o que comemorar! Há muito a ser feito. 
Que tenhamos a volta, com as devidas correções, do Programa Mais Médicos. 
Que tenhamos a valorização do SUS e implantação de novos hospitais no interior dos estados. 
Que tenhamos ampliação das políticas públicas afirmativas na saúde e na educação e que no novo decênio da política de cotas, tenhamos mais ênfase em ações de permanência estudantil, já que acessar a universidade deve significar responsabilizar-se pela qualidade durante a formação de todos os estudantes, especialmente os mais vulneráveis. 
Do lado de cá, sigo com meu compromisso em contribuir para a efetivação e o monitoramento das ações afirmativas na educação brasileira. É para isso que deve servir a ciência. Para evidenciar, a partir de estudos sérios e éticos, a demanda por novas políticas sociais que pautem  a superação das desigualdades de raça, de gênero e de classe.

4 comments:

  1. Vc é luz, mana!! Excelente reflexão!! Parabéns por sua conquista do Doutourado e luta!!!♥️

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    1. Obrigada, mana!! Você também é luz!! ❤️

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  2. Relato muito mobilizador 👏🏾👏🏾👏🏾 Mantenhamo-nos na luta por uma sociedade sem racismo e com equidade.

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    1. Com certeza, Sueli! Obrigada pela visita! Beijo

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