28 May 2011

"Tripulação, pouso autorizado"

Nossa tristeza do retorno é sempre tão previsível quanto as alegrias do reencontro. Estávamos as três enfileiradas, numa aeronave lotada e silenciosa. A conexão Porto Velho-Brasília ocorreu numa madrugada de segunda-feira. Todos aparentavam o desejo de dormir, tão logo as luzes se apagassem. Ninguém queria lanchinho insosso. Aposto que só desejavam compensar o sono interrompido. Menos eu. Quem dera eu conseguisse dormir durante um vôo. A pressão nos ouvidos não permite.
Aproveito para ler aquelas revistas com reportagens tolas e fotos idênticas dos roteiros turísticos mais procurados. Também observo os meus vizinhos. Presto atenção nos diálogos que travam. De vez em quando, converso também. Mas geralmente, sigo calada e com os olhos fuçando novidades. Neste dia, fiquei a observar um grupo próximo a nós. Fiquei intrigada. Não tinha ideia do porque de tantos homens juntos e calados. Eles não conversavam entre si. Nós também permanecemos mudas. Nosso silêncio, porém, era muito diferente do deles. Estávamos cansadas, com sono e muita, muita tristeza de termos, novamente, nos separado dos manos queridos e da mãezita. O silêncio deles, pelo contrário. Era tenso, para que a ação da polícia federal desse certo. Estávamos paralelamente às duas últimas fileiras que ficaram reservadas para policiais armados, presos algemados e, provavelmente, um líder da equipe. As algemas demoraram de ser percebidas por mim. As manas queimavam pestanas, e eu, como sempre no corredor, não conseguia dormir, mais uma vez. Me incomodava aquele silêncio exacerbado, aquela tensão toda, em torno da tropa de elite do fundão. Curiosa que sou, fui ao banheiro e não me contive: vistoriei do alto todos os homens estranhos e caladões. Procurava por explicações. Queria entender o "movimento" entre o tal líder e as comissárias de bordo, tão solícitas e atentas aos desejos dele. Ouvi uma parte da conversa, ao retornar para minha poltrona.
- Senhor, assim que a aeronave pousar em Brasília, os passageiros descerão pela porta dianteira e vocês pela porta traseira.
O homem acenou com a cabeça, como se dissesse: "aceito e estou de acordo com suas condições". 
Nesse momento, uma das manas cochichou: 
- será que são artistas?
- não irmã, eles são da PF...tem três algemados pelas mãos e pés.
As duas, muito atônitas, arregalaram os olhos, como se estivessem vivendo uma cena de filme policial...na viagem delas, logo seríamos rendidas e o tiroteio começaria em dois segundos. Apenas ri da imaginação de ambas, e disse que não estávamos em filmagem, que isso não iria acontecer, sob hipótese alguma.
Fato é que o pouso foi vivido com muito alívio. Ficamos monitorando eles de longe, pelo mezanino, já no aeroporto de Brasília. O carro da PF chegou, montaram uma estratégia de recolhimento dos presos, e partiram em seguida, escoltados e seguidos por outro carro da polícia. A nossa quebra do silêncio começou assim; estávamos tensas demais e precisávamos entender o que de fato era aquela situação. As manas me pediram para eu mudar de assunto; concordei e eu prometi escrever depois, pra falar dessa "quase" experiência como integrante da polícia federal, liderada por aquele homem de porte sério e misterioso. Claro que sentimos medo. Da expressão de cada um daqueles rostos. Fiquei pensando no motivo que teriam para manter os presidiários algemados. Se eram perigosos, e porque tinham sido presos, e para onde estariam seguindo. Será que para alguma audiência de julgamento? Será que seriam transferidos de presídio? E o que pensavam aqueles sujeitos, dada à condição de passividade que se encontravam? Busquei na internet notícias sobre o assunto,  mas não localizei nada. O perigo estava tão perto, que nos sentimos incomodadas de não termos sido avisadas sobre quem eram os vizinhos e esquisitos tripulantes. O sigilo, porém, certamente era para garantir a tranquilidade dos demais passageiros. Depois dessa chegada estranha, fomos ao café. Agradeci pela cena de cinema vivenciada, exatamente como aquelas, de finais felizes, quando todos conseguem sair sãos e salvos. Nós, as mocinhas. Os vilões, não. 

4 comments:

  1. Que é isso, amiga viajante... paradinha sinistra, heim? Mas Brasília envolve mesmo conexões muito estranhas - e é claro que não falo só de lides aeroportuárias, certo? O difícil é ver quem merece ficar enjaulado permanecer mesmo no xilindró. Mas enfim, ainda bem que vc escapou sã e salva. Um beijo e boa semana.

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  2. Jú, as suas viagens lhe permitem experiências ímpares. Tou aqui tentando imaginar a cara da amiga viajante no momento descrito. Beijão.

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  3. Ahahahah policiais, né... já posso imaginar o que (ou em quem) nossa amiga viajante pensou.

    Bjão, Juba, o bloguito tá lindinho!

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  4. Marcelo, Patiinha e Luiz..foi uma tensão grande...mas acabei me divertindo...pra isso, existe a escrita! Viva!! Bj, nos 3!

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